terça-feira, 4 de dezembro de 2012


MIOPIA E DEMAGOGIA
                                  Francimar Moreira


Foi aprovado, na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados, um projeto que reduz a jornada de trabalho no Brasil para quarenta horas semanais. Considerando-se o que vem ocorrendo em todo o mundo, em matéria de desequilíbrios nos orçamentos oficiais, tal medida pode ser altamente prejudicial ao nosso desenvolvimento. Sobretudo porque ainda somos um País em desenvolvimento e com enorme carência de mão de obra qualificada – fatos que nos aconselham o aproveitamento máximo da força de trabalho de que dispomos.

Ora, os países que têm batido recordes em desenvolvimento o fizeram investindo, prioritariamente, em educação, pesquisas e trabalhando duro. E quem tem conhecimento disso, não pode concordar com tamanha contradição, ou tão absurda iniciativa. Sobretudo porque somos um País ainda em construção, onde faltam estradas, viadutos, hospitais, moradias, serviços de esgotos, água encanada e tantas outras coisas que, para construí-las, faz-se necessário maximizar o aproveitamento da força de trabalho que dispomos.  

Como se sabe, o objetivo dos que apoiam tal proposta é, tão somente, flertar com a classe operária. Por isso, espera-se que prevaleça, na hora da decisão final, a lucidez dos que votam com o bom senso e a razão, e não a demagogia vulgar e o interesse meramente eleitoreiro. Até porque, não é difícil adivinhar o que ocorrerá, caso o descanso semanal comece sexta-feira: as farras serão muito mais longas, o consumo de bebidas alcoólicas maior, o número de acidentes no trânsito aumentará muito, a despesa com os acidentados crescerá enormemente. Enfim, é uma ideia extravagante.    

As pessoas dotadas de raciocínio lógico e isentas estão cansadas de saber que as desigualdades sociais, o infortúnio da classe operária e nossas principais mazelas nada têm a ver com a carga horária oficial adotada no Brasil. Mas provêm de um conjunto de fatores e artifícios, criados e sustentados pelas elites dominantes, que lhes garantem o poder de manipulação de tudo e de todos. Têm, inclusive, absoluta clareza de que o caminho para a melhoria da qualidade de vida não é nem será jamais, a simplória redução da jornada de trabalho. Sobretudo, sabem que é falsa a ideia de que o operariado se beneficia com a redução da carga horária.      

Ao contrário dos que aprovaram tal projeto, penso que, num País novo e ainda atrasado como o Brasil, onde falta muito para ser construído, o caminho inverso, ou seja, o estabelecimento de um pacto pelo fim dos feriados e feriadões seria uma medida muito mais sensata e profícua. Desde que, é claro, o aumento de horas trabalhadas e da produção resultasse também em ampliação da massa salarial e outros benefícios para a classe trabalhadora. É isso, sim, o que me parece ajustar-se melhor à nossa realidade econômica e sociocultural.  

É difícil acreditar que alguém possa estar falando sério quando propõe tornar melhor a vida do trabalhador e do povo brasileiro através de uma medida que, simplesmente, reduza trabalho e esforço! É impossível não desconfiar de que estejam blefando, de que tudo não passe de encenação! Principalmente porque não se concebe que cheguem ao Congresso Nacional pessoas desprovidas de conhecimento, a ponto de não saberem que a redução da jornada de trabalho implica, necessariamente, em aumento de custo da produção, o que será, é lógico, repassado aos consumidores e, como todos sabem, os trabalhadores constituem o maior grupo de consumidores do Brasil.

Mas a redução da carga horária não implica, somente, o encarecimento dos custos de produção, o que, por si só, já seria motivo para detidas avaliações. Existe, ainda, o fato de que onera os produtos destinados à exportação, o que é muito relevante, principalmente, no que se refere à política de geração de emprego e renda. É lógico que a elevação de custos torna o País menos competitivo no mercado internacional e já se sabe quais são as conseqüências. E não é de bom alvitre deixar de prestar atenção no que vem acontecendo num país chamado China, onde um modelo político centrado na força concede uma relativa liberdade empreendedora, e vem surpreendendo em crescimento econômico.     

Se não quisermos acreditar que o hábito de fingir, mentir e recorrer à demagogia, que os políticos praticam trivialmente, acabe se incorporando à personalidade deles e contribuindo para ofuscar a mais nítida verdade que se lhes apresenta diante dos olhos ou da consciência, que pelo menos se reconheça que a opção que fazem por assim proceder resulta do fato de saberem que o povo deseja, inconscientemente, que lhe enganem sempre. Afinal, a verdade pode causar uma dor repentina e aguda, enquanto a enganação se vai percebendo aos poucos e, também lentamente, se vai dissipando o seu impacto negativo.  

Creio que se saísse por aí um pesquisador perguntando a qualquer trabalhador:
– Você gostaria que sua carga horária semanal fosse reduzida para quarenta horas, mesmo sabendo que as quatro horas que outro vai trabalhar em seu lugar serão pagas por você, através de aumento de preços dos produtos que você vai consumir?... A resposta seria um retumbante “Não”. Isso, excetuando-se a informação sobre os riscos à competitividade externa e, por consequência, à manutenção do próprio emprego.

Existem, ainda, outras vertentes da causa trabalhista e social que precisam ser consideradas com isenção: primeira, o trabalho deve ser visto como um direito pessoal e um dever para com a sociedade e o estado; segunda, é preciso desmistificar a ideia de que trabalhar é algo muito penoso, motivo de um eterno proselitismo em nome da classe trabalhadora, por seus pseudodefensores; terceira, está faltando trabalhadores (qualificados ou não), ajudantes, carpinteiros, pedreiros, operadores diversos, engenheiros, médicos, cientistas e outros, e para suprir essa carência só existe uma solução, em curto prazo: maximizar o aproveitamento da força de trabalho de que dispomos 

Na verdade, trabalhar é uma necessidade física e psíquica, além de financeira, é lógico. E, ao invés de estarem propondo a diminuição da carga horária, deviam flexibilizar o contrato de trabalho, criando oportunidades mais flexíveis, a contratantes e contratados, de comprarem ou venderem as horas de trabalho de que precisam ou dispõem. Também seria-bem vinda uma compensação para os estudantes que sejam obrigados a trabalhar. Não à custa do empregador, é natural, mas através de bônus do Tesouro ou de desconto em tributos a serem pagos. Afinal, é flagrante a necessidade de um operariado mais bem qualificado – e o caminho é a sala de aula.

E mais: o consumo de bebidas alcoólicas está virando uma epidemia. Bebe-se para fugir do ócio, bebe-se porque faz parte, bebe-se porque virou moda, bebe-se porque outros bebem, bebe-se por dependência... Enfim, consome-se droga como se fosse uma necessidade para a sobrevivência... Sabe-se, inclusive, que o alcoolismo e o consumo de outras drogas estão se transformando em um sério problema de saúde pública que pode se agravar!...

Assim sendo, a ideia de liberar a moçada na sexta-feira significa um final de semana mais longo e, um maior consumo de drogas. O que afetaria a produção e o desenvolvimento, além de contribuir para encher os hospitais de alcoólatras e acidentados. Seria muito bom se todos tivessem consciência sobre de onde saem os recursos para a saúde pública! Assim, talvez, o fingir-se de míope não rendesse tanto sucesso e a demagogia dos politiqueiros não fosse vista como prenúncio de benefícios às massas inconseqüentes.   


Imperatriz, 25 de julho de 2010

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