UM FRAGOROSO EQUÍVOCO
Francimar
Moreira
Movido por um forte esquema midiático, além de muitas
manobras especulativas, os preços de imóveis urbanos em Imperatriz têm
experimentado aumentos astronômicos. É bem verdade que somos,
indiscutivelmente, uma região promissora cujo desenvolvimento ainda está por
acontecer. Em assim sendo, seria natural que nossos pedaços de chão, sejam urbanos
ou rurais, fossem necessariamente valorizados.
Ocorre, porém, que essa valorização se ampara numa
expectativa de crescimento econômico que não condiz com a realidade dos fatos,
pois sabemos que o principal fator econômico de Imperatriz é o comércio e essa
atividade, por si só, nunca foi, em qualquer lugar do mundo e em nenhum período
da historia da humanidade, alavanca para o desenvolvimento sustentável. O seu histórico é de mera influência
cíclica, desde os tempos do escambo, e não houve fatos, econômicos ou socioculturais,
que alterassem essa realidade.
A fragilidade de uma economia que se sustenta na
atividade comercial reside na probabilidade de surgirem novos polos comerciais
em cidades que antes constituíam mercados compradores, além, é lógico, de
existir a possibilidade de migração do negócio propriamente dito. Uma
conjuntura econômica consistente é a que se sustenta em atividades fixas e permanentes,
como a agricultura e a pecuária, ou em grandes empreendimentos industriais e
tecnológicos, de implantação difícil, porém de muita solidez.
Se há quase 40 anos, quando aqui cheguei, já me
incomodava ver o Maranhão importando produtos agrícolas, imagine-se o que penso
hoje, quando observo que até o arroz que consumimos vem da extrema com o
Uruguai e um terço de seu custo final é de frete, encarecendo brutalmente o seu
preço. Citei o arroz como exemplo porque, paradoxalmente, o Maranhão já foi um
grande produtor desse cereal e hoje não produz
quase nada. Mas, infelizmente, até água mineral estamos importando muito, o que
é lamentável.
É evidente que uma região com esse perfil econômico tem,
necessariamente, um histórico político e sociocultural que o tolera e alimenta.
Logo, não se deve, sob pena de sofrer terríveis decepções, esperar milagres em
curto e médio prazos. Isso porque, apesar de nosso fantástico potencial, é
impossível, no mundo do conhecimento e da informação, advir uma forte onda
desenvolvimentista sem que antes ocorram expressivos avanços nas áreas educacionais
e tecnológicas.
Quanto ao fato de estarem instalando ou prometendo
instalar aqui grandes atacados, alguns shoppings,
hipermercados e redes de comércio varejista, não significa isso desenvolvimento.
O comércio vive de explorar as riquezas e potencialidades já existentes e não
tem, por si mesmo, a faculdade de gerar riqueza. Ao contrário do que muitos possam
imaginar, grandes empreendimentos comerciais, principalmente financiados com
dinheiro público e gozando de incentivos fiscais, são, na verdade, fatores de
desestabilização econômica e social. E, em nenhuma hipótese, fomentadores de progresso
e bem estar coletivo, como tentam nos fazer crer políticos mentirosos.
A propósito deste tema, dois caipiras discutiam num
ponto de ônibus, em uma cidade, aqui próximo de Imperatriz, há algum tempo, quando um disse para o outro:
– Cumpade, nossa cidade agora vai proguidi, homi, pois
vão butar aqui um baita budegão, um tal de hipermercado, do grupu dos pessoá lá
de riba, qui vai sê uma beleza! – foi, entretanto, admoestado pelo parceiro,
que retrucou:
– Num se fie nisso, não, homi de Deus, pois isso é uma
faca de dois ligumes!
– Como assim, cumpade, dá pro mode expricá dereito?!
Cumpade, bota
sintido no qui vô lhe dizê, homi: imagine qui chegue aqui um baita desse bicho
qui tu falou, com dinheiro dos imposto qui a gente pagamo e sem tumbem carecer
pagar imposto... sabe o que vai se suceder, homi de Deus?!
– Sei, sim! – exclamou o parceiro, acrescentando:
– Vai criar uns duzento imprego na cidade. Num é muito
baum isso, meu camarada?!
– Ói cumpade, criá
os imprego é bom, sim! Mais o probrema são os efeito colaterá, cê intende?!
– Não, cumpade, eu não sei do qui diabo tu tá falano,
não. Dá pro mode expricá?
– Efeito colaterá, homi, é um efeito não desejado, por
exempro: tu traquina com uma cumade sua, por debaixo das moita e nove mês dispois
nasce um muleque com a tua cara... Isso é um efeito colaterá. Intendeu, homi?!
–
Acho que intendi! – Mais, afiná, qualé mermo o efeito colaterá qui o budegão
vai trazê, cumpade?
– Homi, presta
atenção! Pode inté criá os 200 imprego, cumo vosmicê disse, mais vai quebrar
uns 600 pequeno e médio cumercianti. Digamu que esses futuros quebrados tenham,
em média, um impregado; são, entonce, 1.200 famía diretamente prijudicada. Seis
vez o númro de imprego que você acha que vai ser criado. Mais tem muito mais
efeito, homi! Veja bem, o lucro que o budegão vai ter, num vai ficar aqui não,
vai pras capitá ou inté pro estrangeiro. É aí que todos qui mora aqui sai
perdeno, pois o dinheiro qui pudia circular aqui, nas mão do barbeiro, do
pedreiro, do carpinteiro, dos piqueno e médio cumercianti, vira lucro do
budegão e vai circulá nim outa paragem, homi! Logo, todos aqui serão prejudicadus,
cê intendeu, agora?
– Marrumeno, cumpade, marrumeno!
– Mais num é só
isso, não, homi de Deus! Tem muito mais: se os piqueno e médio vão quebrar,
muitos vão ter que prucurá outa parage, dadonde possa sobrevivê; e logo nóis
vai vê a cidade cheia de placas de VENDE e ALUGA, e os preços dos imóve
dispencano. E tem ainda mais: os quebrado e disimpregado, além de seus fios, vão
virar assartante e matar gente pra robá!... Bota sintido no qui tô te dizendo,
homi, e a dispois vosmicê me fala!...
• • •
Depreende-se da conversa acima que existem matutos por
este Brasil afora que, mesmo analfabetos, raciocinam melhor do que muitos que
ostentam um canudo de bacharel, mestre ou doutor. Aliás, aconteceu,
recentemente, a mais inarredável prova do que
estamos afirmando: um menino matuto, pobre e analfabeto, migrou de pau-de-arara
de Garanhuns (PE) para São Paulo e virou Presidente da República. E mais:
deixou em seu lugar, em homenagem à Dona Lindu – sua mãe – e a todas as
mulheres do Brasil, uma mulher valente. E, mais ainda, deu um banho de cuia em
generais e muitos doutores.
Imperatriz, 20 de dezembro de 2010
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